quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

parabéns

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vamos comemorar o marcador de visitas ter chegado ao número 9000!
obrigada minha gente
o que isso significa? absolutamente nada...

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

a grande questão/o início de um outro blog

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Estive pensando: como se luta contra a banalidade?
A quietude é um estado de espírito, uma vivência internalizada das sensações. Falar exige por demais energia e pensamento lógico, aliás, mais do que esses dois fatores. Falar assume uma ação intrincada e complexa, mesmo que seja a coisa mais frívola a ser dita, 'como o tempo está frio'; existe a sua posição como comunicador e aquele com quem você se comunica, se comunicamos, é preciso que nos façamos compreensíveis. Não existe motivos para invertemos a sequência lógica da frase do tempo estar frio por qualquer outra sequência que fosse, a princípio, arbitrária ou anarquista. A outra pessoa não entenderia, ou até poderia fingir entender, mas em algum momento rompeu-se o fio da comunicação e mesmo que tenha sido uma frase muito banal para ser dita, foi uma perda desnecessária de energia e motivação vazia, nula. A troco de nada. Afora isso, quando falamos, externalizamos em palavras o que estamos pensando, e o pensamento em sua maioria das vezes tem uma formação nebulosa. Quando ele existe internalizado, suas conexões são feitas rapidamente, mesmo que de maneira um tanto indefinida. Ainda no caso frívolo, por exemplo, podemos pensar de modo subjetivo sobre o porquê estar frio. É capaz de os pensamentos vagarem de um extremo a outro. Se formos verbalizar, no entanto, pegamos apenas uma fração disso para ser organizada em uma sentença lógica. Então buscamos palavras e as entonações adequadas para aquilo que se quer dizer, porque não basta apenas as palavras em si, pois a ela junta-se todo o gestual e a melodia da fala. Ao falarmos do tempo frio, podemos dizer de várias maneiras. E não pensamos na frase pronta de antemão, mas de alguma maneira ela vai se formando à medida que tentamos clarear a fração do pensamento para aquela pessoa que está nos ouvindo.
Falar é complicado. Ao menos para mim, de alguma maneira que não entendo, tem sido complicado. São muitas coisas a serem levadas em conta: a escolha das palavras, a maneira com que você se comunica, a coerência com aquilo que lhe é interno e está sendo externalizado, é isso, sobretudo a coerência!, e ao final das contas, a rejeição da banalidade. Ao menos esse último é motivo pessoal meu.
E por que tudo isso?, você poderia se perguntar. Talvez exatamente porque se não estamos sendo coerentes, então estamos falhando em nossas relações humanas. E encontrar a coerência entre aquilo que está no seu pensamento e a forma com que você expressa verbalmente seu pensamento não é pouca coisa, pelo contrário, é algo de importante! Não deve ser visto com leviandade! É a expressão humana.
Claro que acabo falando aqui de uma coerência relacionada apenas à expressão, mas isso acaba se refletindo em um todo. Você não saber falar de maneira clara e precisa aquilo que você quer falar é um problema (essa é uma frase que poderia ter saído de um livro tolo de autoajuda, perdoem-me), porque você não estará se expressando por inteiro. Como consequência, sua relação com aquele que o ouve também não é completa, pois você não se fez entender por completo.
A isso somam-se também as diversas sutilezas perceptíveis. A cada segundo que você faz uma pausa para se lembrar de alguma palavra, sua credibilidade perante os outros cai.Imperceptível, dá para perceber pelo desvio de olhar que o outro faz nessa hora, como se te achasse um indivíduo muito flutuante sem clara certeza de suas palavras. Como uma dúvida.
A comunicação humana, no entanto, é repleta de remendos e tropeços e imperfeições. Sim, de fato. Está sujeita à maleabilidade. Mas não será talvez isso a causa de tanta incompreensão no mundo?
Não falo de boa oratória, mas talvez de articulação. Ter a capacidade de articular seus pensamentos de forma coerente, tanto com o que se quer falar quanto na forma com que se pretende falar. Se ao ser humano fosse dado apenas o direito de viver isolado, jamais - pense, jamais! - necessitaríamos disso. Não seria preciso falar! Por que falaríamos? Com quem? Poderíamos, é claro, conversar sozinhos com as estrelas, mas a comunicação seria outra, talvez. Mais louca, mais livre. Talvez emitiríamos sons, como os animais, embora o som também possa fazer parte de uma estrutura lógica.
Mas enfim. Ao final das contas, como já disse Tarkovski, a experiência do autoconhecimento é o único objetivo da humanidade; o homem "está eternamente estabelecendo uma correlação entre si mesmo e o mundo". E essencialmente é isso. Estamos o tempo inteiro nos relacionando de uma forma ou de outra, com outros e com nós mesmos. Mediando esta relação estão diversas formas de expressão, entre elas a fala. E podemos ser incompreendidos em muitos níveis. Talvez resta a cada um se perguntar em até qual medida se quer ser compreendido.

A minha, na mais completa e profunda possível. A banalidade é apenas a superfície de um oceano...
e ao se buscar essa comunicação mais completa e profunda é que se conhecem os e seus limites. (Acho que aí reside a minha atual luta interna)...


em tempo: Tarkovski fala por mim! Ainda que fale sobre cinema, veja o que ele diz sobre as palavras:
"O roteirista pode (...) escrever, simplesmente: 'Os personagens param junto à parede', e prosseguir, acrescentando o diálogo. No entanto, o que há de especial nas palavras que estão sendo ditas, e o que elas têm a ver com o fato de se estar de pé ao lado da parede? O sentido da cena não pode estar concentrado no texto dos personagens. 'Palavras, palavras, palavras' — na vida real, estas têm pouco significado, e só raramente, e por muito pouco tempo, pode-se testemunhar uma perfeita harmonia entre palavra e gesto, palavra e ato, palavra e sentido. Pois, em geral, as palavras de uma pessoa, seu estado interior e suas ações físicas desenvolvem-se em planos diversos. Eles podem se complementar ou, às vezes, até certo ponto, estar em concordância mútua; no mais das vezes, porém, elas se contradizem, e em alguns momentos de extremo conflito, desmascaram-se mutuamente."

terça-feira, 24 de novembro de 2015

um quadro para Raskólnikov

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Que sensação a de se encontrar com uma figura que julgava ter criado apenas na imaginação! Quando havia lido Crime e Castigo imaginava Raskólnikov em um quarto de teto afunilado, paredes marrons, ambientação um pouco escura, não sei se havia pensado em alguma janela, mas certamente a cama ficava encostada à parede. O chão poderia ser de assoalho, aquela madeira antiga que levanta muito pó. Mas imaginava sobretudo o teto. Não sei dizer exatamente se o que eu imaginava derivava da descrição do livro ou era a minha mente correndo solta - afinal, faz anos que li, mas o barato da leitura é justamente esse. Tampouco consigo explicar como é que a memória guarda essas ambientações imaginárias que fazemos com cada livro que lemos!
Mas eis que encontro sem querer essa imagem em algum canto da internet:



Der arme Poet (O poeta pobre) é um quadro do séc. XIX do pintor alemão Carl Spitzweg - e parece que um quadro bastante popular e adorado entre os alemães. Não conhecia a imagem e o que me chamou a atenção de imediato foi ter notado uma semelhança assustadora com a ideia que eu havia construído na imaginação do quarto de Raskólnikov, exceto talvez pelo tamanho do aposento, que no quadro está pequeno e apertado demais, em relação a um quarto mais espaçoso, porém vazio, que eu havia dado ao personagem. Para ficar ainda mais parecido com o que eu figurei, sabe-se lá de onde, eu teria que inverter a imagem:





E assim a minha imaginação sente-se quase invadida em segredo! Que sensação diferente...

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

não é bem isso que eu queria dizer

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não sei bem pra quem estou escrevendo no momento,
mas queria dizer que há projeto novo saindo do forno com esse mesmo título
ele resume bem o que anda acontecendo e a falta de textos no momento:

uma noia na escolha das palavras.

nenhuma palavra que escolho e nem a construção das frases estão exprimindo aquilo que eu quero dizer.
não é desesperador?
as palavras entopem no bueiro e escapam só as mais fáceis, lisinhas, redondinhas, sempre escritas, sempre ditas. Que ódio.
perceber clichês na própria ordem das palavras, e depois nas palavras em si, é ofender o português.
e eu adoro o português!


terça-feira, 28 de julho de 2015

o mundo do conceito

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Vamos começar essa história falando de um jeito claro: João, nosso personagem, mora em um lugar medíocre, não importa se esse lugar é macro ou micro, é bairro cidade ou país. O julgamento de ser medíocre, porque afinal é um julgamento, não é subjetivo. Está evidente que João tem, para um jovem de sua idade, uma cabeça desordenada de informações circulantes e pipocantes de tudo o que forma as regras invisíveis do lugar onde mora, porque ele não é capaz de tomar uma decisão sozinho ou uma decisão que julga tomar sozinho. Vamos ver porquê.

Depois de uma jornada exaustiva de trabalho, João recebe seu salário, mas no dia seguinte acorda se perguntando se é aquilo mesmo que ele quer, trabalhar-dinheiro-trabalhar, porque ele observa os outros à sua volta e todos parecem estar ganhando dinheiro de um jeito bem legal. João assiste televisão e lê revistas e descobre que esses outros são chamados de “empreendedores” e são a nova onda do século. Os empreendedores aparecem bem nas fotos, alinhados e sorridentes, discorrendo sobre o novo aplicativo revolucionário (aspas aqui) que inventaram para os novos celulares quase robóticos e que, santa mãe, rendeu um milhão no primeiro ano. A TV e a revista exaltam. Quando João passeia pela internet no meio do seu trabalho durante o dia, todos os seus jovens amigos querem fazer o mesmo. Estão todos comentando as infelicidades de suas miseráveis vidas, e como poderiam todos estar fazendo outra coisa. Sempre qualquer coisa que não o que fazem agora. O futuro, para eles, é algo que se alcança somente se a felicidade e o prazer baterem à porta. Eles pensam que poderiam viajar pelo mundo inteiro, carregando apenas um celular e um computador com internet, e assim tudo pode acontecer. João não sabe o que sente. Afinal, se basta apenas um celular e um computador, por que ele e todos ainda não mudaram radicalmente suas vidas?

Sem saber o que sentir, João sai no seu horário de almoço procurando um lugar para comer. Está andando entre vários restaurantes, com uma fome desgraçada, e são todos muito agradáveis. João queria uma comida, mas se deteve em frente a um balcão que oferecia algo apetitoso: uma vida saudável. O balcão parecia oferecer diversas opções de refeição, mas João entendeu outra coisa. Entendeu que ali poderia comer sem culpa, tudo era livre de gorduras e calorias; poderia comer alimentos verdadeiramente orgânicos, escolhidos com cuidado por trabalhadores de uma cooperativa do interior do Estado, que trabalham seis horas por dia, com direitos de trabalhador, representatividade de sindicato e trator próprio. Almoçando ali, João comia também a bela arte do design de letras finas e cores divertidas dos títulos, o tratamento de imagem em cima dos milhos reluzentes e as sucintas frases motivadoras escritas na parede: “comer bem faz bem”, “aqui você pode comer sem culpa” e a clássica “sorria, você está levando uma vida saudável”. João não entendeu quem levou o julgamento de bom ou ruim também para o almoço. Mais do que não saber o que comer, João não sabia mais o que deveria comer.

Sem saber o que comer, decide voltar para casa. Tem um encontro com uma velha amiga. Sua amiga circulava por muitos grupos sociais e grupos de estudantes da sua faculdade. Ela chega à sua casa vestindo roupas de academia e uma camiseta com os dizeres “eu sou fitness” em letras verde limão. E já chega dizendo que ele está fora de forma, e que ela estava exatamente como ele, mas começou um ótimo treinamento, que aliás deve continuar para completar sua meta programada para o dia, portanto deveriam ir para o parque conversar. A sua meta só termina com o levantamento de vinte quilos em cada perna na academia ao lado de sua casa. E, é claro, tudo acompanhado de uma rígida dieta de calorias, jantares de caldo verde, sucos “detox” e sol de manhã, pois essa é a receita para ser feliz, conforme diz o casal de atores abraçados e alegres no painel com a marca da academia.
Os dois caminham pelo parque e um casal de meninas passa ao lado deles, de mãos dadas. João continua andando naturalmente, mas sua amiga sorri para o casal e faz um gesto de “paz e amor”. Depois comenta para o João: temos que respeitá-las, elas são minoria. João não entende o comportamento da amiga, pois João não viu um casal de minoria, viu apenas duas meninas juntas e isso não lhe trouxe nenhuma reação adversa. Sua amiga se enfurece e diz que por pensamentos machistas como esse é que o país não anda para frente. Sai bufando e começa a correr pelo parque, deixando João para trás, que está ainda sem entender por que foi tachado de um nome que sequer se aplica ao que ele é.


Sem ter mais com quem conversar, ele se senta em um banco do parque, desolado, aproveitando os últimos minutos do seu horário de almoço. Em resumo, não sabe o que deve fazer com a sua vida, o que deve comer, como deve cuidar do corpo e como deve se comportar socialmente perante todos os grupos. Está sentado olhando para o parque. Nesse momento, uma jovem garota senta-se em um banco em frente a João, procurando algo em sua bolsa. O cachorro que a acompanha na coleira também se senta, esperando a dona, e olha fixamente para João. João o observa, o pequeno cachorro da menina está vestindo uma saia rosa com um colete amarelo, na cabeça tem diversos penduricalhos presos ao pelo, inclusive uma estrelinha de bom cão colada na testa. Veste sapatinhos que parecem apertados. O cachorro olha para João com olhar de desespero, como se pedisse para tirá-lo dali de um mundo que criou um conceito para vestir o cachorro como gente. João olha para o cão com o mesmo olhar de desespero de quem está com a cabeça cheia de minhocas. 

sábado, 30 de maio de 2015

Lorival e Nelson

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Moravam os dois: Nelson, na cadeira de rodas, e seu amigo Lorival, o ajudante. O conjugado de número 43 na esquina com a mais famosa padaria era prático e objetivo: um sofá de dois lugares, uma televisão de tubo em cima de uma mesa de três pernas e um toco de madeira, um pano cinza cobrindo a claridade vinda da janela, um pequeno fogão ao lado de uma geladeira de dois terços da altura de Lorival, de cor azul bebê descascada e uma pia de mármore branco encardida. Comiam na sala. Lorival com o prato no colo e Nelson com uma pequena mesinha adaptada. É que não sentia as pernas.

No fundo, um banheiro apertado com ladrilhos dos anos 80 e um quarto com um armário e duas camas. A luz do quarto piscava porque a fiação estava comprometida e Lorival sempre se esquecia de arrumar. Por causa disso deixou de acender a luz do quarto, dizia que não era mais preciso, já que em frente à janela piscava um semáforo, o que o ajudava minimamente a enxergar o ambiente. Nelson gostava menos ainda dessa solução, pois dizia que o quarto ficava parecendo aposento de puta, que não é em si um grande problema, "o problema é que não há puta!".

Nelson perdeu a sensibilidade das pernas em um acidente literário. Lorival anda normalmente, mas é um pouco biruta, dizem. Nelson é a mente de Lorival e Lorival é as pernas de Nelson. O mutualismo já dura mais de 30 anos, embora a origem tenha se perdido nas poeiras do tempo. O que importa mesmo é que Nelson é escritor e Lorival jamais tira sua velha blusa furada de três cores - creme, marrom e mostarda. Leva a cadeira de rodas a passos lentos de quem já tem vasto cabelo branco e rugas pretéritas. O comum a ambos é uma touca de lã, que usam nesses dias de muito frio.

Lorival gosta de cinema e Nelson tem muito sono. Saíam cedo de casa para pegar a sessão das sete, em uma famosa Mostra de Cinema que acontecia na cidade. Os ingressos eram de graça, e o hall de entrada do cinema de rua lotava de iminentes jovens cineastas com muito a dizer sobre seus próprios filmes. Lorival geralmente estaciona Nelson em um canto onde não atrapalha ninguém; de costas para a rua, ao lado do balcão da cafeteria. Deixa-o ali enquanto esvazia o lixo de sua sacolinha a tiracolo, que leva a qualquer lugar, e que comumente tem o jornal do dia que Nelson adora ler. Livra-se de alguns pequenos papeis, experimentando todos os lixos diferentes do lugar, andando para lá e para cá com saciável curiosidade. Nelson fica. Tira do bolso o caderninho que usa para anotar suas frases literárias e observa o que já escreveu. Lorival vê um dos cineastas conversando com seus amigos críticos e senta-se ao seu lado para ouvir a conversa. "Acho que meu filme tem uma sensibilidade única, que poucos vão entender. Demoramos seis meses só para fazer a primeira cena". Lorival guarda a frase na cabeça para dizer a Nelson.

Lorival fica na fila do caixa, retira uma nota solta de dentro da calça e pede um saquinho de pão de queijo. Volta para seu amigo, cutuca seu braço e entrega os pães de queijo recém-saídos do forno. Nelson pega e não diz nada. Lorival agacha e pergunta "quer café?", Nelson diz que sim. Lorival volta à fila do caixa e compra um café, grande, que entrega ao seu amigo, depois volta novamente à fila e compra outro saquinho de pão de queijo para si. Deixa Nelson ali parado, comendo sozinho, e volta às suas andanças. Pergunta a algumas pessoas a hora, já está próximo da sessão. Vai à bilheteria pegar o bilhete de Nelson, entrega a ele e depois volta para pegar o seu. Entram na sessão, Lorival senta ao lado de Nelson e diz:

- O rapaz desse filme disse que a sua sensibilidade é única e que poucos vão entender.

Nelson bufa e não maneira a altura da voz naquela sala de cinema silenciosa:

- Que besteira que esses jovens pensam!

Alguns viram a cabeça para olhar de onde vem aquela voz e, sobretudo, a afirmação raivosa. Mas a penumbra não os deixa definir o rosto, e voltam a seus mundos um pouco mais seguros do que antes.
O filme começa, Lorival tenta prestar atenção, mas Nelson já caiu no sono e está roncando um pouco alto. A primeira cena, aquela que demorou seis meses para ser feita, não prende a atenção de Lorival, que deixa a sala com Nelson dormindo. Sabe-se lá por onde andou e quais outras conversas ouviu... Pouco antes de acabar o filme, Lorival volta à sessão para levar Nelson embora. Este, emburrado, não diz nada, mas escreve em seu caderninho.

Lá fora, vou ao ponto de ônibus e encontro Lorival e Nelson esperando a lotação. Digo que inventei uma vida inteira aos dois, dando-lhes nomes e endereço? Nelson se adianta e me diz com oratória de locutor:

- Deixa eu lhe dizer uma coisa, minha jovem, que pode ser muito útil. Recentemente, os franceses descobriram que repolho branco e agrião podem impedir o câncer de intestino, uma doença muito grave que chega a matar uma pessoa a cada cinco. Ouviu bem? Repolho branco e agrião. Essa notícia saiu em um jornal de pequena circulação e como é muito importante, estou lhe dizendo para que possa repassar a outras pessoas e evitar a incidência de câncer de intestino.


Agradeci a sua notícia e pouco depois seu ônibus chegou. Vi os dois embarcarem ainda em tempo de ouvir Nelson dizer: "amanhã tem que me levar para fazer a barba e o cabelo". Lorival acenou e a porta do ônibus fechou atrás de si.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

uma clarideia

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acho que a maior percepção que alguém pode ter sobre a vida
e uma das mais leves
é compreender que tudo, tudo, é discurso, construção social, significação humana.
ao universo cabe apenas a nossa existência, a constituição biológica


e isso me faz pensar naqueles que aplaudem o pôr-do-sol
não há nada de errado no pôr-do-sol
e nem no nascer do sol
e nem nos que aplaudem, seja o que for
mas isso me lembra uma música:
you realize
the sun doesn't go down
it's just an illusion caused
by the world
spinning round*
se os que aplaudem o por-do-sol aplaudem uma causa física
normal, sem qualquer sentido embutido,
executada desde o começo dos tempos
também deveriam aplaudir as marés,
a lua crescente,
os solstícios e os equinócios
os terremotos
assim como o movimento de translação
mas eles não aplaudem uma causa física
aplaudem um sentido social construído
de serem felizes,
de serem aceitos,
de acreditarem na beleza,
de acreditarem que são seres abençoados.


e aí então não há dúvidas: vivemos em ilusão.




*do you realize?, the flaming lips


 

lacrônico, o espaço das crônicas. © 2010

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